Consegui organizar com uma agência de viagens um guia que falasse português para que não escapasse nada aos meus pais nas explicações feitas pelos guias.
Estamos em Goa, o guia entre os 50 e 60 anos chama-se João Agnelo Ferrão e, apesar de nunca ter posto os pés em Portugal, fala bem português com um sotaque indiano o que dá uma graça imperdível! Um castiço!
Foi ele que nos disse que "quem viu Goa, não precisa de ver Lisboa!" Claro que este dizer faz sorrir quem quer que o possa ouvir e conheça Lisboa! Mas adiante. Como estamos em Pangim, atualmente Panagi, que é a capital do estado de Goa, começamos pelos bairros típicos do centro da cidade. Aqui podemos ver as casas coloridas com traça portuguesa.
Encontrámos a casa Pereira!
Visitamos a exposição de António Xavier Trindade, o primeiro pintor indiano com influência europeia. Esta exposição encontra-se na Fundação Oriente presente em Goa.
Velha Goa foi a próxima paragem onde se encontram:
a Sé Catedral dos Dominicanos,
a Igreja do Bom Jesus dos Jesuítas (onde se encontra o corpo de S. Francisco Xavier)
e a Igreja de S. Francisco de Assis dos Franciscanos.
Foi dentro desta ultima que fomos encontrar a inscrição da sepultura de um dos antepassados do João, mesmo em frente ao altar. A família Camara "all over"!!
A verdade é que, em Goa, não é exagero dizer que passamos o tempo a tropeçar em catedrais, sés, capelas, oratórios, etc. Também há templos de outras religiões, mas a presença das igrejas católicas é impressionante!
Gosto de Goa, pelas fantásticas praias do norte e a comunidade hippie que por aqui continua a dar vida a Goa, pela vegetação que é tão densa que quase esconde as casas, pela marca portuguesa tão presente nos nomes das ruas, das traças das casas, mas acima de tudo pela importância que sinto que tem a fé. Uma fé que liga ao essencial e que, por isso mesmo, deixa transparecer que o sistema de castas perde alguma da sua força. Uma fé que liga as pessoas independentemente das suas origens ou do que fazem ou conseguiram alcançar na vida! É o que me apaixona na FÉ!
Durante este mês de Julho, cada vez que saia à rua passava por
pessoas vestidas essencialmente de cor de laranja com uma vara ao ombro e
com dois sacos em cada extremidade da vara para manter o equilíbrio.
Fui
perguntando a alguns indianos o que significava e todos foram dando
algumas explicações mas só agora consegui perceber e por isso posso
escrever sobre esta gigantesca peregrinação.
Yatra significa
viagem e Kanwar significa vara, por isso, fiquei a saber que se trata de
uma peregrinação que acontece todos os anos, entre o mês de Julho e
Agosto de acordo com o calendário Hindu, que é feita pelos devotos do
deus Shiva.
Nas extremidades das ditas varas, que nunca podem ser postas
no chão, vai água sagrada que cada um dos peregrinos foi buscar ao rio
Ganges ("Ganga River") para levar aos diversos templos do Deus Shiva, nas suas aldeias
ou cidades. E andam quase sempre mais de duzentos quilómetros a pé e,
como estamos na época das monções, com chuvadas que parecem verdadeiros
dilúvios.
A "Yatra", esta peregrinação, começou por ser feita
por alguns santos e alguns devotos até aos anos 90, altura em que
começou a ganhar popularidade. Hoje em dia é feita por centenas de
milhares de peregrinos que vêm dos estados próximos de Deli: Uttar
Pradesh, Haryana, Rajastão, Punjab, Bihar, e até mesmo de Jharkhand,
Chhattisgarh e Madhya Pradesh.
Os meus Pais estavam cheios de
curiosidade a ver estas romarias cada vez que saímos à rua. Soube que
para os hindus, se durante este mês, só praticarem boas ações recebem
muitas bênçãos nas suas vidas. Adorei a resposta da minha mãe: "Neste
mês e nos outros todos!"
Pois é, independentemente das
diferentes religiões e crenças, o mais importante é fazermos e sermos o
exemplo do bem e é isso que nos une a todos e que é o mais universal.
Esta é uma experiência única para se poder perceber as profundezas desta Incredible India!
Ninguém sabe exatamente o que quer dizer INA. Uns dizem ser onde em tempos foi o "Indian National Army" e outros dizem ser "Indian National Airport" por estar ao lado do aeroporto nacional.
É um mercado central onde se pode encontrar de tudo um pouco. Há bancas com com mercearias, com o que chamamos drogaria, com artigos para costura, e quanto mais se vai andando para dentro mais os cheiros ficam fortes... As especiarias, os vegetais, as frutas e depois o que quase nos obriga a pôr uma mola no nariz: a peixaria com um cheiro mesmo forte e a parte mais difícil, o talho com todos os tipos de carnes de animais e com os próprios animais ao lado que pressentem o seu destino...
Tinha de levar os meus Pais ao INA, um mercado que jamais passaria em qualquer um dos critérios da ASAE mas que mostra o dia a dia deste povo e de como as inovações e sofisticações que existem em Deli se misturam com inúmeros mercados informais como este em que estivemos!
Ainda nem consigo acreditar, os meus Pais estão aqui em casa connosco! Chegaram de madrugada por isso estamos todos meio atordoados... Quero mostrar-lhes tudo mas ao mesmo tempo que estes dias sejam também para "só ficar", kongokhala!
Vai ter de ser uma combinação dos dois. Acima de tudo é uma grande graça tê-los aqui em Deli. Welcome to India! E só espero que se sintam tão bem acolhidos e que fiquem tão fascinados, como eu, por esta incredible India!
Hoje, Domingo, dia de estar com Deus também na missa. Vamos à Catedral de Deli porque apesar do calor gosto das homilias desta missa. Por ser a Catedral é uma igreja muito visitada por turistas e por indianos que se vê serem praticantes de outras religiões.
O que esta igreja tem de extraordinário é a sua universalidade no momento da comunhão. Todas as pessoas podem ir na fila para receber o corpo de Deus ou uma benção. Foi isto que me comoveu, que me deixou o coração cheio. Como um simples gesto pode ser tão transformador, tão inclusivo e tão extraordinariamente Universal.
Quem não está preparado para receber o corpo de Deus cruza os braços nos ombros e recebe uma benção na testa! Lá fui a tremer e esfuziante ao mesmo tempo! Braços cruzados no momento e... benção! Nem tenho palavras para descrever a beleza do momento que vivi!
E se a Igreja em todo o mundo tivesse esta prática?
Logo a seguir não conseguia deixar de me lembrar do livro de Pedro Lamet, Pedro Arrupe, o polémico Superior-Geral dos Jesuítas, e da máxima que nesse livro aprendi "quanto mais universal, mais divino"!
Ps- Foi o entusiasmo da Francisca AT que me fez ler o livro sem parar. Igualmente incrível é também o fato deste jesuíta ter bebido muito da cultura asiática!
Antes de irmos para o Sri Lanka já sabíamos que íamos receber a nossa primeira visita semi-oficial cá em casa. Por isso, chegámos completamente "zombies" da viagem e da escala mas entusiasmados com o nosso convidado: Eng.º António Guterres, antigo primeiro-ministro português e ex-alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
Como sabem, o Governo português formalizou, no fim do passado mês de Fevereiro, a candidatura do Eng.º António Guterres a Secretário-Geral das Nações Unidas, através de uma carta do Primeiro-Ministro dirigida aos Presidentes da Assembleia-Geral e do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Em Junho, foi lançado um site oficial sobre esta candidatura: www.antonioguterres@gov.pt, que tem como título "Uma vida dedicada ao serviço público."
Entretanto, há dois ou três dias, teve lugar uma votação feita pelos membros do Conselho de Segurança, para que cada um dos Estados Membros se pronunciasse de forma meramente indicativa pela sua preferência. E o resultado não podia ter sido melhor para o nosso convidado, com 12 votos de encorajamento, 3 não oposições e 0 oposições. O que colocou o candidato português no topo do ranking ao lugar de Secretário-Geral das Nações Unidas. Mas como nos foi dito pelo próprio candidato é indicativo e ainda tudo pode acontecer.
Ontem, dia 22 de Julho, o Eng. António Guterres veio apresentar a sua candidatura à Índia e por isso tivemos o privilégio de estarmos pessoalmente com o candidato.
Foi entrevistado cá em casa por uma televisão indiana.
Para mim, que não conhecia pessoalmente o Eng. António Guterres, foi uma surpresa que superou completamente as minhas expectativas. Durante a entrevista sobressaíram: a sobriedade, a humildade, a seriedade, o conhecimento, o empenho e a estratégia que revela sobre a realidade dos refugiados e sobre as Nações Unidas. E acima de tudo a naturalidade com que diz ser católico e ser esse o motivo que o faz querer servir.
O sucessor de Ban Ki-moon só deve tomar posse em Janeiro de 2017, e provavelmente o processo de seleção deve ser concluído no último trimestre deste ano.
Eu, fico completamente a "torcer" e a rezar para que o Eng. António Guterres seja o próximo Secretário-Geral das Nações Unidas, e não é por ser português que talvez fosse razão suficiente, mas por ter visto uma humanidade tão focada em querer servir. O mundo precisa de pessoas assim!
Quem é que sabe onde está a referência ao Sri Lanka n' Os Lusíadas?
Quem é que não sabe a primeira estrofe d' Os Lusíadas de cor?
As armas e os barões assinalados
Que da ocidental praia Lusitana, Por mares nunca de antes navegados, Passaram ainda além da Taprobana, Em perigos e guerras esforçados, Mais do que prometia a força humana, E entre gente remota edificaram Novo Reino, que tanto sublimaram;
Pois é, mesmo na primeira estrofe que é referido o Ceilão Português, actual Sri Lanka. Nem mais, nem menos: Taprobana!!!
Desta vez o encontro com o Presidente Maithripala Sirisena, foi mesmo no fim da nossa viagem e não houve ensaio. Começou com a escolta policial do hotel para o Ministério dos Negócios Estrangeiros para o encontro com o Chefe do Protocolo que mostrou um vídeo de como tudo é suposto acontecer.
Depois fomos para a Casa Presidencial. Aqui encontrámos mais três colegas do João, Embaixadores residentes em Deli e não residentes no Sri Lanka. A ordem dos países a apresentar credenciais foi: México, Portugal, Grécia e Irlanda.
Também estive presente na conversa com o Presidente que, apesar de perceber inglês, fala sempre cingalês e por isso sempre com a respectiva interpretação.
Com o João como Embaixador no Sri Lanka, saímos deste país ainda mais cheios. Eu pelo menos, não podia ter gostado mais. Um destino que não é muito conhecido e que recomendo o mais possível. Aqui sentimo-nos em casa. Até agora, o povo mais simpático que conheci!
Aubowan Sri Lanka! É o mesmo que dizer Namaste. Still here and already missing it!
E a acender as velas no hotel, deixámos o nosso antigo Ceilão!
Hoje fomos explorar a capital económica do Sri Lanka, Colombo. Já que a capital parlamentar e judicial é Kotte desde que aí foi construído o novo Parlamento.
A vista do nosso quarto é absolutamente fabulosa.
O Sri Lanka é um país maioritariamente budista, mas onde há lugar para mais religiões. Seguem-se os Hindus, os Cristãos, os Muçulmanos e os Burgers que são holandeses protestantes.
Começámos por um dos mais famosos templos Hindus de Colombo e fiquei a saber que são Tamil, provenientes de um estado do sul da Índia. Ainda tenho de ler mais sobre o hinduísmo porque são muitos deuses animais, homens, mulheres e ainda não me interessei nem empatizei por puro desconhecimento. Aderi à pinta que nos põem na testa. E aqui ficam alguma imagens.
Depois foi tempo de ir à Igreja de Santo António (St. Anthony) onde me lembrei e rezei pelo meu afilhadinho António Maria. Zé GL obrigada pela dica!
Aqui foi tempo de integrar todos os rituais: comer umas pedras de sal, ver a a imagem de Santo António considerada uma relíquia porque, segundo a Preena, esta imagem chegou pelo mar. Daí talvez o sal do princípio. E não resisto a transcrever a passagem de Mateus 5 (13) "Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens."
Depois rezei. Acendi cinco velas com cinco pedidos que guardo comigo e com Deus! Mas posso garantir a todos os que me conhecem que estão numa destas velas!
Por fim, fomos visitar um dos muitos templos budistas. Este é especial porque, segundo consta, Buda esteve aqui. E é aqui que doutrina se divide: uns dizem que foi em vida, outros que foi uma aparição de Buda. Essencialmente é por uma das duas correntes que se tornou num templo muito visitado pelos seus praticantes.
Como um senhor com o ar mais amoroso e decidido do mundo me entregou um vaso de plástico cheio de água e com flores em cima, cumpri o ritual sem saber nem bem nem mal o que estava a fazer. Nunca hesito, sei sempre a quem rezar por isso não há grandes motivos para atrapalhações.
Entrar de pés descalços é o que os Templos, Igrejas ou Mesquitas têm em comum, também por aqui. E aderir faz parte da aculturação e de devolver a simpatia de quem nos sorri ou estende os braços!
Ficou a faltar a ida a uma Mesquita porque já tinha estado numa igreja protestante em Galle.
O mais importante é o que fica de todas estas experiências tão diferentes. A importância da FÉ na vida deste povo e desta cultura que me deixou completamente "in love".
Galle é uma cidade no sudoeste do Sri Lanka. No séc. XVI era o principal porto do Ceilão para os portugueses. Foi construída uma fortificação e uma capela franciscana pelos portugueses mas completamente em ruínas. Tanto que com as posteriores colónias e respetivas construções, já não conseguimos encontrar os nossos vestígios...
Dentro do Forte de Gaulle pudemos encontrar uma mesquita, um templo budista, uma igreja reformada holandesa, um antigo hospital holandês e um museu marítimo. O interior do Forte tem ruas estreitíssimas em os edifícios antigos foram convertidos em lojas, restaurantes, etc. tudo com imensa pinta!!! Este é mesmo um must do in Sri Lanka.
No caminho que fizemos de volta a Colombo ainda parámos num viveiro de tartarugas. Aqui lembrei-me do meu sobrinho Joãozinho que estava completamente fascinado com as tartarugas quando os levamos ao Jardim zoológico em Lisboa. Dadinha, estas fotografias tens de lhe mostrar!!!
De volta à estrada e como vínhamos à beira mar pudemos ver vestígios do sismo e tsunami que aconteceu no dia 26 de Dezembro de 2004. Havia imensas casas em ruínas e centenas campas de cada um dos lados da estrada. Depois de 12 anos, é impressionante como ainda são visíveis estas marcas...
Há coisas que me acontecem em que fico a pensar se as devo ou não partilhar mas na dúvida é como uma das frases da Madre Teresa de que mais gosto e que a Rita B. me relembrou há uns dias num comentário: "tudo o que não se dá, perde-se."
Fomos jantar com a Consul Honorária de Portugal, Preeni Pinto, o seu marido e filho. Tudo a correr lindamente, a conversa, a comida, o conceito do restaurante. Entretanto, entra um casal no restaurante com um filho pequeno e sentam-se numa mesa em que a mãe fica virada para mim. São muçulmanos, ela de cabeça tapada e o marido completamente à ocidental, de calções e t-shirt. Parecia que alguma coisa não devia estar bem. Quase não falavam e ela estava agarrada ao telemóvel, uma invenção que tornou o mundo global a um clique de distância mas que pode ser mesmo um meio de grandes males... Enfim, não é disto que quero falar.
Assim que o marido se levantou ela, uma rapariga jovem, afundou a cabeça nos braços e o filho continuou entretido com um telefone ou um jogo. Estava indecisa, mas tinha de ser rápida. Levantei-me sem dizer nada na mesa, não havia tempo, e fui perguntar-lhe se estava tudo bem, ela disse que sim. Disse-lhe para se concentrar nela e no filho. Ela sorriu e disse: "Thank you, sister!" De uma forma tão sentida e ternurenta, a mostrar que a cumplicidade entre as mulheres é universal.
O jantar continuou. Alguém na mesa perguntou se estava tudo bem e eu disse que tinha visto uma rapariga que parecia atrapalhada mas que parecia que estava tudo bem. E a conversa sobre Portugal e o Sri Lanka continuava normalmente na nossa mesa.
Ao mesmo tempo os meus pensamentos voaram até aos primeiros anos da faculdade quando li um livro que uma colega, a Sara P., me disse que tinha de ler porque era impressionante: Vendidas, de Zana Muhsen. É a história de duas irmãs filhas de pai iemenita e mãe britânica. Foram passar umas férias ao Iémen que imaginavam que iriam ser um sonho e acabaram por ser vendidas pelo pai para casar à força e ficarem perdidas numa aldeia. A Zana, mais velha, depois de oito anos de luta consegue fugir, mas Nadia, a mais nova continuava presa na altura em que li o livro. A Zana e a sua mãe continuaram a fazer tudo o que podiam para tirar a Nadia e o filho desta do Iémen, mas não faço ideia se acabaram ou não por conseguir. Na altura lembro-me de ter ficado meses ou anos a pensar na vida daquelas duas irmãs e do que seria feito da Nadia.
O casamento infantil é um tema com que lidei em Angola, um flagelo na Índia e infelizmente em muitos países do nosso mundo em pleno séc. XXI.
Antes disso, já tinha visto o impressionante filme "Rapto em Teerão" e foi assim que fui tendo conhecimento do mundo muçulmano. Depois os ataques terroristas do 11 de Setembro em 2001 e os posteriores que foram acontecendo ao longo dos anos, a cultura e religião muçulmana foram chegando até mim e ao mundo, da pior maneira possível. E é uma tentação a facilidade com que se pode rotular todo o mundo muçulmano.
De volta ao restaurante, o silêncio continuava na mesa do casal muçulmano e eu continuava inquieta. Assim que a rapariga se levantou para ir à casa de banho, lá fui eu. Pode parecer horrível, mas foi daquelas coisas incontroláveis. Ela parecia tão infeliz e tão jovem... Assim que entrei na casa de banho, estava de cabeça destapada. Adorei! Estava a lavar a cara. Perguntei-lhe de onde era, ao que ela respondeu que era dos Emiratos Árabes Unidos e que estava de férias. Voltei a perguntar-lhe se estava tudo bem. Ela contou que andavam a viajar de carro pelo Sri Lanka e que estava cansada e enjoada com tantas horas de carro. Disse-me que tinha mais duas filhas que estavam nos Emiratos Árabes Unidos e que só tinham vindo os três. Que alívio! Eu já estava a fazer um filme daqueles... Foi então que tirámos fotografias, mesmo na casa de banho. No fim, voltei à minha mesa não sem antes ela voltar a dizer:
"- Thank you, sister!" Com a mesma forma sentida, ternurenta e cumplice.
É ótimo quando conseguimos dar um passo para desconstruir preconceitos!
E agora com a situação do mundo: as guerras que duram anos sem fim, os ataques terroristas que aumentam a sua frequencia e a necessidade de acolher os refugiados é mesmo urgente que o medo do desconhecido em geral se supere procurando informação e dando o devido lugar ao outro, igual a nós, que está numa situação frágil que não escolheu e que tem tanto direito à vida e a uma vida digna como cada um de nós.
Falar de Buda significa falar de Siddhartha Gautama, mestre religioso e fundador do budismo no séc. VI AC.
Apesar da história não ser exata nem em datas nem em locais, consta que Buda nasceu no Nepal, em Lumbini, e foi criado no reino ou principado de Kapilavastu, território hoje dividido entre a Índia e o Nepal.
Os seus pais eram príncipes e detinham reinos aos quais Siddhartha seria naturalmente sucessor. Mas aos vinte e nove anos, o confronto com a miséria e os moribundos fizeram-no mudar o seu caminho. Começou por ser mendigo para se privar dos bens materiais e quando estava quase a morrer de fome, lembrou-se de um episódio da sua infância em que vê o pai a arar a terra. Neste momento atingiu o estado concentrado, focado, feliz e abençoado: o jhana.
Mais tarde, Siddhartha sentou-se debaixo da árvore Bodhi a meditar à procura da verdade. Foi então que teve uma iluminação (enlightment).
A imagem do momento do enlightment
E assim, mudou o seu nome para Buda que quer dizer desperto, iluminado, que sabe. Durante a iluminação, Siddhartha compreendeu as causas do sofrimento e os caminhos necessários para eliminá-lo. Estas descobertas são as Quadro Verdades onde assenta o budismo, em que se atinge o estado nirvana.
Para Buda, nirvana é o estado perfeito de paz mental livre de toda a ignorância, inveja, orgulho, ódio e outros estados aflitivos. Por perceber a dificuldade e profundidade que implicava atingir este estado e por ver as pessoas tão fortemente influenciadas pela ignorância, inveja e ódio, Buda teve dúvidas se deveria ensinar e partilhar a iluminação que tinha tido. Mas foi convencido para o fazer e assim iniciou a sua pregação. Começou uma religião. O budismo.
Buda morreu na cidade de Kushinagar, no estado de Uttar Pradesh, na Índia. As suas cinzas foram repartidas por vários governantes para serem veneradas como relíquias.
Em Kandy fomos visitar o templo Budista mais importante do Sri Lanka porque, pelo que consta, está lá guardado um dente do Buda. Não se pode ver por ser uma relíquia mas foi o que nos contaram.
Lugar onde o dente esta guardado, a reliquia que faz deste lugar tao especial.
Foi a primeira vez que entrei num templo budista. Desde que cheguei que queria perceber mais sobre esta religião. O princípio não podia ter sido melhor no país com o povo mais simpático, amável e acolhedor que conheci até hoje!
Os cingaleses contaram que a flor de lotus tambem e a sua flor nacional, nao tenho a certeza. Aqui estao as oferendas, centenas de flores de lotus, a Buda.
O nosso destino era a cidade de Kandy, mas fizemos uma paragem pelo caminho num orfanato de elefantes!
O orfanato chama-se Pinnawala e é fantástico o trabalho que por aqui estão a fazer. Começou em 1975 com sete elefantes. Os elefantes órfãos são trazidos para aqui onde podem estar com muitos outros até estarem prontos para regressarem ao seu habitat. O primeiro elefante bebé nasceu em 1984, mas até hoje ja há registo de sessenta e nove nascimentos.
Tenho reparado que os elefantes na Ásia são diferentes dos de África porque a parte da testa e tromba parece que está desbotada e é quase sempre mais clara do que o resto do corpo.
Chegámos na hora do banho e estava uma animação. Mas a determinadas horas pode-se dar comida aos elefantes! Fica para uma próxima oportunidade.
Estava a tomar o pequeno almoço e já conseguia ver a sessão de fotografias de um casamento. E quando desci a sessão ainda continuava. Fiquei fascinada! Parecia outro tempo, outro mundo. A verdade é que é tão diferente... Aproximei-me e perguntei aos noivos se podia tirar uma fotografia. Disseram logo que sim.
A tradição aqui é o beije e dourado enquanto na Índia é o encarnado e dourado. Contaram-me que a noiva começa a arranjar-se entre as duas e as três da manhã...
Mas o mais especial pela diferença é o traje do noivo com um chapéu imponente e umas calças que parecem ter uma espécie de almofadas que lhes dá um efeito volumoso! Parece que é um traje único no Sul da Ásia.
Por aqui também a maioria dos casamentos são arranjados mas cada vez há mais, como eles dizem, "love marriage".
O antigo Ceilão ou Ceilão português foi uma colónia portuguesa entre 1505 e 1658. Nessa altura, o território que corresponde hoje ao Sri Lanka estava dividido em reinos. Os portugueses entraram pelo Reino Kotte. Tem graça porque o primeiro português a chegar ao Ceilão português chamava-se Lourenço de Almeida e nós conhecemos um seu descendente com o mesmo nome, durante o nosso tempo em Luanda.
Kotte foi a cidade que começou por ser a capital do Ceilão português. Só em 1565 é que a capital passou a ser Colombo.
Depois dos portugueses, passou a ser dominada pelos holandeses. E no fim do séc. XVIII foi a vez do domínio britânico que se vê na arquitectura da cidade. Só em 1947 é que o Sri Lanka se tornou independente.
Pelo que vi de Colombo, em breves horas, é uma cidade movimentada e parece ser cosmopolita e onde se mistura à arquitectura colonial a arquitetura moderna.
Mas acima de tudo é uma cidade à beira mar, com estradas ótimas, tudo limpíssimo (principalmente para quem vem da Índia) e o povo é uma ternura sem igual.
Foi há onze anos, quando dava aulas de Português a três turmas, na Missão de Fonte Boa, em Moçambique, que tantos e tantos alunos se aproximavam de casa ou batiam à porta e quando lhes perguntava o que queriam, diziam com um sorriso rasgado:
"- Kungokala!"
E era simplesmente irresistível não devolver um sorriso. Kungokala é uma palavra que, em Chichewa, quer dizer "só ficar". Mas só ficar, mesmo!
Se por acaso estava, ou a escrever alguma coisa, ou a dar explicações, ou a ensaiar na viola os cânticos para a missa diária a que quase nunca falhava, era completamente indiferente. Quem quer que tivesse vindo com esse propósito não esperava nada em troca, era mesmo pela vontade de sentir a presença. E posso confessar que é das coisas mais humildes e sublimes que já experimentei, que dá uma paz transcendente e que mais me transformou por dentro.
Entretanto, duas amigas sem sequer se conhecerem, Teresa C. e a Joana C, falaram-me do livro "Adam's, God's beloved", de Henri Nouwen, que escreveu um livro mais conhecido "The return of the Prodigal Son" (O regresso do filho pródigo) que muitos devem conhecer. Esta é uma história verídica. Henri é padre, teólogo e escritor americano que, ao ter de lidar com um jovem adulto com deficiências físicas e mentais, encontra verdadeiramente Deus. De uma beleza inenarrável em que a completa e total dependência do Adam transformava o coração de todos os que com ele se cruzaram. Escusado será dizer que estava completamente obcecada a ler e a sublinhar o livro para poder perceber melhor a realidade de quem tinha lidado diariamente com pessoas com deficiências. Mais uma vez encontrei o tal saber só estar, ou só ficar que dá o sentido que todos procuramos na vida.
Agora, o conhecimento das casas das Missionarias da Caridade, a leitura dos princípios de Madre Teresa e o contato, quase diário, com a Kavita que sempre que lhe pergunto "Who am I?", para ver se ela reconhece a minha voz, me responde a sorrir "Rachel ma'am"! tudo ficou ligado. A vontade de só ficar com a Kavita e de só ficar com as outras crianças cresce a cada dia!
Três continentes: África, América e Ásia. O mesmo exemplo da máxima atenção ao outro, a alegria do dar, do viver para o outro. E a universalidade do SÓ FICAR!
Fotografia: Filipe Condado (também voluntário na Missão de Fonte Boa em 2002)
PS - Não resisti a deixar aqui estas caras que ainda me são tão familiares. Principalmente o rapaz do lado direito que foi meu aluno, o Xavier. Que saudades!